quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

Loreta (parte 2)

Alguns dias atrás, em uma grande cidade mexicana de fronteira (o ideal, mas não essencial, é que as historinhas sejam lidas em ordem):
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Jesse e Jorge chegaram a El Paso. Estavam tão sujos e cansados que Jorge parecia até um jegue comum para quem olhava, sem o vigor que lhe era característico.
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- Chegamos na sua terra, Jorge. Quem sabe você não encontra sua família aqui.
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- iiihhh ohhhh - Respondeu Jorge.
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El Paso era uma cidade grande, seca, suja e bela. Cavalheiros andavam de um lado para o outro com seus paletós impecáveis; bêbados dormiam apoiados em mesas empoeiradas, ao lado de suas garrafas vazias; comancheiros, caçadores de recompensa, pistoleiros, assassinos, todos conviviam em uma harmonia estranha, típica de El Paso, onde parecia reinar uma certa ordem.
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De um lado as autoridades, representadas pela família Banger, concediam certa liberdade para a anarquia dos diversos tipos de indivíduos que passavam pela cidade; por outro lado, os baderneiros sabiam que, por estarem em El Paso, deveriam respeitar certas regras essenciais, principalmente para não criar problemas com o implacável Xerife Banger.
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E assim se vivia na "cidade da fronteira", nesse estranho equilíbrio entre o caos e a ordem.
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Jesse arranjou um pouco de agua para Jorge, amarrou-o, e entrou no "Bang Bar". Não demoraria muito para perceber que, naquela cidade, quem mandava e desmandava era a família Banger.
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- Buenas tardes! Me vê um copo de... água. - Disse Jesse à senhora atrás do balcão.
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- Buenas Señor. Non queres beber algo mais... fuerte? - Perguntou a dama por de tras do balcão. Era muito bonita.
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- Ahh... Não, obrigado. - Respondeu Jesse, um pouco encabulado.
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Jesse às vezes se envergonhava de si mesmo. Onde ja se viu - pensava - um cowboy procurado, com uma reconpensa de 180 dólares nas costas, montado num jegue e que, ainda por cima, não gosta de bebidas alcoólicas.
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A moça do balcão deu um sorriso enigmático. Jesse não conseguiu identificar se ela estava rindo dele ou para ele. Era mais que provável que estivesse rindo dele mesmo.
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- Entonces, qual o seu nome? Nunca te vi por aqui. - Perguntou a dama, agora estranhamente sem o sotaque, enquanto lhe empurrava uma caneca grande, cheia de agua.
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- Meu nome é David, sou do Texas. - Mentiu Jesse.
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- Tenho um irmão com o mesmo nome. E o que faz na cidade David? - perguntou a moça, debruçando-se no balcão.
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Jesse sentiu um calafrio, pensou: "Meu Deus, é muito bonita. Será que me viu chegando de jegue?"
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- Tudo bem se não quiser responder. - Falou a moça, desconfiando da demora de Jesse para falar.
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- Não, não. Não é nada de mais. Meu patrão comprou 500 cabeças de gado de um fazendeiro logo abaixo do rio. Pretendo ficar pela cidade até as águas baixarem. - Mentiu novamente.
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Loreta Banger tinha achado o rapaz do outro lado do balcão muito estranho e interessante. Era a primeira vez que trocava mais de 5 palavras com um homem sem receber uma cantada. E ele nem sequer havia perguntado seu nome.
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Loreta era uma moça alta, de 19 anos. Tinha os cabelos bem pretos e lisos, a pele morena e os olhos bem negros e apertados, pareciam muito com os olhos dos comanches que habitavam o norte da região. Não parecia nada com a falecida mulher de Mr. Banger, o que gerava o boato de que ela seria o fruto de uma aventura do xerife com uma comanche que conheceu durante a construção da ferrovia.
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- Meu nome é Loreta, Loreta Banger. Filha do xerife da cidade e dono desse bar.
- Disse Loreta, com um ar de superioridade. No fundo, tentava despertar algum interesse no forasteiro, aparentemente indiferente à sua beleza.
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- Prazer, Srta. Banger. - Respondeu Jesse, sorrindo meio abobado.
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A verdade é que Loreta não poderia despertar mais interesse em Jesse. Ele estava vidrado em seus olhos, no movimento de seu cabelo, em tudo. O nome da moça ecoava em sua cabeça e ele o articulava silenciosamente com a boca... "Lo-re-ta". Se sentiu ridículo. Pensou - "Talvez ela esperasse receber uma cantada" - Para logo depois afastar o pensamento - "Não, eu não saberia o que dizer".
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Após alguns minutos de constrangedor silêncio, com Loreta ainda debruçada no balcão, entrou um senhor bem alto, forte e moreno no bar. Tinha cabelos brancos e longos caindo pela face e, no peito, carregava uma estrela dourada onde se podia ver escrito "Sheriff".
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- Santo Deus! Tem um jegue selado amarrado na porta! - Gritou Mr. Banger, o homem alto de cabelos brancos, entre risadas, logo após atravessar a porta do bar. - O homem que monta esse animal não pode usar calças. - Completou o xerife, provocando a risada de todos.
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- O homem que monta esse animal... - disse Jesse se levantando - ...é o mesmo que o derrota em uma corrida contra seu melhor cavalo, e montado em um jegue. - Completou Jesse, segundos antes de ver a estrela no peito do adversário.
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"Caramba, é o pai dela!!!" - pensou.
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Mr. Banger se assustou com a ousadia do forasteiro, mas, passado o susto, não economizou gargalhadas.
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- Pois bem, forasteiro. Estava precisando me divertir. Vou à paróquia receber o novo padre, e depois encontro você em frente ao bar para uma corrida. - Disse Banger, depois de boas risadas. - A propósito, qual o seu nome?
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- Meu nome é Jesse, Jesse Wilde. - Respondeu Jesse, esquecendo-se de que havia se apresentado como David para Loreta.
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- Muito bem Jesse. Depois decidimos o valor da aposta. - Disse o xerife, antes de sair do bar sorrindo para ir receber o padre.
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